PROVOCAÇÕES NO DIA DO PSICÓLOGO


O dia 27 de Agosto é tido como o "dia do psicólogo". A escolha deste dia se deu devido ao fato de que foi em 27 de Agosto de 1962 que a profissão foi regulamentada através da lei 4.119, o que nos daria meros 54 anos de existência oficial no país. Uma profissão jovem, mas que tem ganhado espaço e tem amadurecido através de suas controversas. Ainda assim, em meio à psicólogas/psicólogos que defendem a cura gay, a pena de morte e a exploração dos trabalhadores através de leis "flexíveis" temos que olhar atentamente para nossa história e nos perguntarmos que psicologia estamos desenvolvendo pelas terras tupiniquins!

 Sei que soa pessimista ao leitor. Deveria eu estar exaltando a categoria? Poderia sim. Há coisas boas de fato. Mas tenho em mim um espírito inquieto e sei que os que partilham desse sentimento não se sentirão incomodados com as colocações. Iniciei meu texto perguntando que psicologia estamos desenvolvendo por estar tendo alguns conflitos com minha prática profissional, que envolve majoritariamente neste momento aquilo que Jessé Souza chama de "ralé brasileira", tendo eu operado diretamente com seus recortes sociais caricatos de loucos, drogados, pobres, criminosos, putas etc. constituídos majoritariamente por negros e negras.

E que conflitos seriam estes? Vejam bem: a faculdade me ensinou muitas técnicas e através de uma número insignificante de professores e um número significativo de espaços de troca entre colegas também me proporcionou uma formação crítica, alinhadas à preceitos considerados de esquerda. Supunha eu que era um tanto "desconstruído" e com uma mentalidade não hegemônica, o que nos leva muitas vezes a crer que nosso fazer é automaticamente libertador e crítico, resquícios talvez de uma vaidade acadêmica e burguesa. Mas não é bem assim! O que dispara esta escrita tem a ver com meu exercício de trabalhar em grupos em espaços institucionais e também voluntários, onde atendo estas pessoas que mencionei acima. E é na medida que tento olhar para minha prática e minha teoria, balizado por algumas insuficiências, que cheguei à conclusão de que ainda continuo sendo um psicólogo que atua em algum grau com técnicas e referenciais que foram feitas para um ideal de homem branco, "civilizado", ocidental, obediente, "do bem", contido e culto. E que a maioria das produções sobre o dispositivo grupal ainda são produzidas em cima de saberes que foram feitos por e para este ideal de homem. A maioria das coisas que aprendemos, mesmo as mais "progressistas" ainda são insuficientes e conflitivas com a realidade social do subdesenvolvimento brasileiro. Operar com essas teorias com pessoas onde a subjetivação se dá pela violência e o desamparo nos leva a, no mínimo, nos frustrarmos e vermos o quanto ainda estamos distantes de criar dispositivos que consigam nos colocar em uma relação que dialogue com a vida destes sujeitos. Em suma: ainda temos muito o que avançar na construção de uma Psicologia genuinamente brasileira.

Ainda assim, em passos lerdos, temos tido contribuições técnicas significativas. Jorge  e Emilia Broide, Neusa Santos Souza e as contribuições do Diga Aí Maré são algumas contribuições técnicas que têm me ajudado no trabalho com o povo e que demonstram um esforço de uma práxis que tenta fazer do impacto de um saber ocidentalizado e branco com a realidade social do país um motor para a criação de uma Psicologia brasileira.


Neste dia então quero comemorar aqueles da categoria que se arriscam a serem pioneiros e que estão dispostos todos os dias, diante de tantas dificuldades, a colocarem seus corpos e seu aporte teórico "na roda", dispostos a se permitrem transformar através do encontro físico e real com aqueles que a sociedade insiste até hoje em excluir e violentar. Se há um bom rumo para nós é este. E um piso salarial decente, claro... para não perder o humor.

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