O conceito de vanguarda é muito caro para toda a esquerda, seja pelo viés de sua afirmação ou seja pelo viés de criticar sua existência e/ou a operação da mobilização política utilizando-a. Eu gosto de admitir a existência de uma vanguarda, apesar de não acreditar que essa posição se sustenta por muito tempo com determinado grupo.
Estou escrevendo isto por estar vivenciando a intensa conjuntura de lutas em andamento em Porto Alegre. Só esta semana foram diversos atos, ocupações, piquetes, mobilizações e eventos voltados à reivindicação e difusão de pautas que envolvem direitos sociais: habitação, emprego, salário, educação etc... Não são poucos os trabalhadores e estudantes se mobilizando e indo para a rua - e definitivamente não se tratam de meia dúzia de arruaceiros ou vadios. É nesse imenso caldeirão de luta social que vou então em um espaço seleto de pessoas, com o intuito de organizar um movimento mais firme em torno da saúde. Neste espaço somos intelectuais e trabalhadores em sua maioria. Hoje é muito claro que o movimento em torno da saúde anda desmobilizado e, especificamente falando agora do Sul, tem uma falta de organicidade causada em parte pelo intenso aparelhamento que esta última década de governo petista realizou em suas bases sociais.
Neste espaço tentamos nos reorganizar e surgem em algumas falas a ideia de que somos ali uma vanguarda e que nossas atitudes serão de vanguarda, pois iremos reativar na população o ideario do SUS e sua história. Tive de discordar. Conheço esse vício, que normalmente é fomentado dentro de organizações políticas onde se aprende a olhar pro próprio umbigo do que ao redor. Se há uma vanguarda hoje em Porto Alegre é o movimento dos secundaristas e os das ocupações urbanas, como a Lanceiros Negros. São movimentos que nos tocam e que não estão ali necessariamente querendo ser vanguarda, mas que hoje estão articulando em torno de si mais de uma pauta e tipos diferentes de pessoas. Qualquer pessoa, movimento ou organização que preste precisa abrir mão de se ver como detentor de alto saber e olhar para os fatos, para surfar na onda levantada por esta gente e aí sim construir não só discursivamente, mas praticamente, uma unidade.
Ontem marchei com os secundas. Faziam críticas à traição da UBES. QUeria muito estar ali com mais gente, com cartazes e faixas defendendo o SUS e a reforma psiquiátrica. Pra mim, ali era um lugar necessário de estar com nossas bandeiras, bem como construindo nas escolas lugares de debate sobre saúde, SUS e sua relação intrínseca com o direito à educação. E não, isto não anula a necessidade de continuarmos nos reunindo.