Estamos vivendo um
momento fervoroso no Brasil. Nesta ascensão
de um movimento massivo em nosso país, levando os mais diversos setores – dos acomodados
aos ativistas – às ruas brasileiras, o povo começa a aprender na pele a dura realidade da luta
pelos direitos fundamentais dentro do subdesenvolvimento, materializada
principalmente pela alta repressão estatal, independentemente de que a mobilização
seja pacífica.
Inicialmente
o estado usou a fórmula “infalível” de sempre: porrada e ideologia. Achou que
como faz todos os dias reprimindo manifestações de minorias ou de camadas
marginalizadas iria dar conta do recado e impedir de que qualquer manifestação
fosse pra frente. Tão logo começaram as manifestações embrionárias e a
violência policial, começou também a mídia burguesa e hegemônica a disseminar
as ideias de sempre: trata-se de uma minoria; vândalos; vagabundos; drogados;
desocupados etc... Ocorre que tanto o estado como a mídia hegemônica não imaginavam
a potência da mídia independente, ancorada hoje principalmente pela internet.
Se antes a população contava com muito pouco para narrar e provar a sua versão
sobre as manifestações e atos de rua, hoje pode fazer circular rapidamente na
rede todo o tipo de material textual e audiovisual produzido por aqueles que
estavam diretamente na luta. O resultado disso foi a comoção generalizada, em
especial de setores tradicionalmente acomodados, que se enxergaram solidários
com os manifestantes pioneiros. Esta comoção, na verdade, não é mágica: é fruto
de uma opressão constante e cotidiana, que embora em menor grau nem sempre
encontra sentido claro ou coletivo. Naquele momento, a violência contra aqueles
que reivindicavam seus direitos à cidade disparou a insatisfação contida nos cidadãos,
que viam ruir qualquer ideia de democracia diante da brutalidade estatal. Rapidamente
este sujeito estava nas ruas e em tempo menor ainda aprendeu no calor da ação
de rua, nas lágrimas decorrentes de bombas de gás e no grito de seu compatriota
ao lado que a insatisfação não era insignificante ou apenas sua, e que o que se
falava de repressão não era mentira. Em pouco tempo a mídia hegemônica e seus
representantes mais populares encontravam-se em posição de constrangimento, uma
vez que agora nenhum discurso barato poderia mascarar a marca de uma bala de
borracha por apenas estar protestando na rua. Não tardou para que viessem os
pedidos de desculpas. Agora, como mágica, o discurso passa a ser outro e o
ativista deixa de ser o vândalo para ser manifestante pacífico e até exemplar.
Em uma das cidades a PM até negociou “de cara” com manifestantes.
Precisamos
nos atentar a contradição disto que, se pode ser avaliado como um dos desdobramentos
da força do movimento também pode ser a semente de sua derrocada e cisão.
Primeiro, precisamos nos afirmar enquanto movimento político. Não há nada de
errado nisso: não saímos na rua por uma questão moral e utilizarmos esta
palavra não significa uma associação direta com o partidarismo clássico. Ao
adotarmos esta compreensão podemos entender que a política se faz sustentado em
pautas, em programas: em interesses. Qual é o nosso interesse? Acabar com a
corrupção? Evidentemente, todos queremos isso. Mas o que isso
significa? Licitações mais justas para as empresas de ônibus? Mudar de
presidente? Adotarmos outro regime governamental? Reduzir o aparato público ao
máximo (entendendo que são seus funcionários a gênese de toda corrupção)? Um
movimento sustentado pela conscientização em massa, com a participação direta e
constante dos cidadãos no seu governo? É nesta ambiguidade que surge a atuação
da reação. Se entendermos que neste exato momento anseios populares expressos
das mais variadas formas estão em choque com os interesses do próprio estado,
representante da Ordem do sistema, rapidamente veremos que a mudança discursiva
da mídia hegemônica, representante do status
quo, sustentada e sustentante dele, não surge apenas como um sinal de
vitória, mas fundamentalmente como manobra política tática, de recuo, para
manter-se na disputa ideológica da população. Desta forma, passa a incutir em
nosso movimento, que é um movimento de mudança, sustentado na tensão do NOVO, as
ideias de um movimento de “consenso”; um movimento “pacífico”, sem vandalismo/tensão,
que quer “só” o bem da nação e ser ouvido com dignidade. A aparência discursiva
destes aparatos midiáticos mudou da negação da manifestação para sua afirmação
DESDE QUE não seja de nenhuma forma questionadora ou radical. Porém, a linha é a mesma: manifestem-se, contanto que
não mudem demais o país, não sejam radicais ou políticos. O interesse do estado
é que isso cesse; que a copa do mundo aconteça, que o transporte público
continue rendendo, que os índios não atrapalhem, que o “progresso” continue. O
nosso interesse, repito a pergunta, qual é/será?
Segundo,
admitindo que temos interesses que entram em conflito com os interesses do
nosso governo, devemos afirma-los com toda nossa força. A força de nosso
movimento é a sua massificação e consciência; o poder que tem ao criar um clima
onde florescem as mais variadas produções humanas e projetos de sociedade. É
preciso aproveitar estes ares e pensar urgentemente no que queremos, saíndo do
campo de um discurso ambíguo de “contra a corrupção” e entrando em questões
hoje fundamentais: direito à cidade, à cultura, à moradia digna, à educação
gratuita, ao transporte público gratuito
etc... Em suma: sermos filósofos no sentido mais radical e renovador o possível. O movimento deve sempre
pensar a si mesmo.
Acredito
e sempre acreditarei no meu país, na sua cultura e no nosso povo. Sou
brasileiro com muito orgulho, misturado mesmo: etnicamente e massivamente a
cada passo e berro que dou no mesmo dia e no mesmo horário que compatriotas de
todos os cantos do país.
Luís Giorgis Dias
Estudante de Psicologia

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