“Não posso ser
normal”. Assim se concluía o pensamento de Tomás naquele começo de madrugada.
O funcionário
público não conseguia mais lembrar por que, mas por algum motivo desencadeou
uma série de pensamentos que o fizeram recordar seus amores mais importantes. Deitou-se
em seu sofá empoeirado e fechou os olhos por alguns instantes. Resgatou delas
todos os detalhes: olhares, cheiros, perfumes, hábitos, sotaques, cartas,
juras, brigas, crises; beijos, sexo, maciez da pele, formatos do rosto e do
corpo, maneirismos, lugares; prazeres e dores. Impressionou-se como todas se
enquadravam nas crises comuns à idade. Foi quase como se tivesse vivido todos eles
de novo e ao mesmo tempo, cada detalhe sensorial ou perceptivo lhe fazia ter
mais certeza disso. Foram umas 7 ou 9
garotas.
Perguntou-se o
que teria se tornado sem elas. A resposta: muito pouco. Gostava de quem ele era
hoje, e muito foi pelo que viveu com elas. De cada companheira que teve,
extraiu um ganho para si. Sentiu saudades. Mas não era uma saudade “normal”,
tipo aquela que fica entre o “é possível matar essa saudade” e “não sei se
poderei matar essa saudade”, causando uma ansiedade gostosa que não é bem
ansiedade, pois mesmo que se fique sofrendo e se antecipando ver e sentir a
pessoa, no fundo você sabe que vai ver ela de qualquer jeito. Ele sentia uma
saudade que não sabia definir. Parecia uma nostalgia que se misturava com
alívio. A nostalgia brotava das saudades, mas o alívio era proveniente da
sensação de que talvez ainda gostasse delas daquele jeito de antes. Elas não
estavam mais ali e talvez nunca mais estejam, mas ele ainda gostava delas,
embora não soubesse bem de que jeito. Concluiu que só podia ser loucura imaginar
que ainda gostava delas, cada uma com um “gostar” específico e único.
Então concluiu
que era doido. Estava na casa dos 30, seus pensamentos pareciam o de um velho e
obviamente ninguém pode continuar gostando de amores antigos, não faz nenhum sentido. “Tudo passa” foi
o concluiu para si, afinal, é o que dizem por aí... Mas a pulga continuou atrás da orelha.