Bagé,
grandiosa rainha da fronteira! Alegrou-me com o frio e com a família. Mas,
sempre, sem exceção, cada retorno aqui me marca de forma positiva e desta vez
não foi diferente!
Passava eu,
rapaz natural de Aceguá (e não me importa se na época o município ainda era
anexado de Bagé), por uma das praças da cidade e deparei-me com um monumento no
formato de um obelisco. Engraçado: passei por lá inúmeras vezes e tal monumento
sempre passou em branco, como se não existisse. Neste dia ele ficou em destaque. Na placa,
além dos nomes dos estados, constava a data de 1922 e de que se tratava da
comemoração dos 100 anos da independência brasileira. A reflexão imediata não é
nova e muito menos minha: “que
independência “? E mais: Feita por quem e conquistada por quem? E digo quem,
pois o “vácuo” é justamente este: o do sujeito.
Não o sujeito individual, mas o sujeito coletivo. Esta memória está
marcada nos livros, documentos, monumentos e nos mais diversos discursos de
intelectuais burgueses (e olhe lá), mas diferentemente das grandes nações
emancipadas não vejo estas marcas no simbolismo do povo. Esta memória, quando
relatada, surge como uma espécie de fábula longínqua. Não há nenhum afeto
relacionado ao tema, com exceção do humor ou da sátira que ridiculariza Dom
Pedro em seu jumento branco. Podemos eternamente continuar ensinando esta
história que não é nossa para toda juventude, inclusive com a maior
acessibilidade do mundo: ainda assim sua artificialidade continuará somatizada
no povo na forma da não lembrança ou da irrelevância na vida cotidiana. Há uma
característica no brasileiro atual muito bem apontada pelo psicanalista Joel
Birman : o desamparo. Este sentimento, inerente ao ser humano, ganharia
centralidade na subjetividade do cidadão uma vez que este, em função do
subdesenvolvimento, é exposto de forma exagerada às contradições do capitalismo
e do neoliberalismo: desemprego, violência urbana, morte, fome, riscos de todos
os tipos etc... A iminência e a incerteza estariam latentes na população
hoje. Os desdobramentos deste tipo de
situação são os mais variados, mas é indubitável que a confluência disto com a
“ausência” (entra aspas, pois o negro, o índio, o trabalhador e os pobres possuem
uma história própria, ainda que não oficial) de uma história feita por nossas mãos e por nosso sangue,
acaba por contribuir na crença de que políticos específicos, indivíduos
“honestos” , partidos políticos ou Deus irão resolver nossos problemas sem que
tomemos parte deles, isto quando não se pensa de forma narcísica que o sujeito
próprio da reflexão resolverá tudo por si. Fenômenos como Joaquim Barbosa para
a presidência, o assistencialismo ou a negligência individual em tomar parte da
política surgem justamente como desdobramento deste tipo de postura.
Ainda assim, como bom sintoma, a
expressão disto que seria um mal também traz aquilo que seria um bem, uma vez
que é justamente uma insatisfação diante de nossa história e ao nosso modelo
político que afasta o povo de seu papel de sujeito. Uma das soluções para isto está
na história. Não essa história contada por outros, em especial brancos
europeus, mas a que resgata as resistências e o preço que o brasileiro oprimido
tem pagado nestes 500 e tantos anos na base de sangue e violência. Que ressalte
as chagas de exploração e enganação que temos carregado, e que somado à
experiência política prática como as lutas de rua nos coloque nos eixos da
formação de um povo realmente independente e soberano. Paremos pra pensar: a
independência, tanto material quanto subjetiva, só poderá ser edificada por nós
e jamais será presenteada por alguém que diante de atos “respeitosos” decide
concedê-la de boa vontade.
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