A PSICOLOGIA PRECISA SEMPRE SER POSICIONADA


Já são 6 anos de formado e essa é uma data sempre bacana de viver e reviver coisas, pois foi no 27 de Agosto de 2014 que eu me formei Psicólogo pela UFSC. Na ocasião eu e a colega Ana Raquel Barcellos fizemos um discurso realçando a necessidade de uma Psicologia que esteja em contato íntimo com aquilo que acomete a imensa maioria da população brasileira, que é ainda hoje um país desigual, racista, transfóbico, misógino e que hoje maquina intensamente em seu cotidiano a organicidade de um modo de ser e de viver que é fascista por excelência. Adeptos conscientes ou não dessa maneira de viver hoje se organizam pra questionar a Psicologia, que difere deles ao se posicionar a favor da vida. Mas que vida? É isso que quero trazer e reforçar: a Psicologia é e precisa ser posicionada!

Quando digo “pela vida” não refiro essa vida conformizada, que em nome da normalidade subjuga e faz com que nossas vontades de “ser mais” freirianas se tornem conformadas a uma regra que serve a poucos. Definitivamente não podemos estar ao lado daqueles que buscam todos os dias nos uniformizar, seja forçando uma igualdade em nome de uma bandeira nacional verde-amarela, azul e, ressalto, branca. Seja também nos convocando para “salvar uma economia” que dizem ser nossa, mas que parece todos os dias não nos pertencer. Nosso Ofício mostra a importância de sustentar a possibilidade de nos constituirmos outros assim que parecer pertinente: como seres humanos a adaptação plena é sempre uma morte em vida e o interessante será em meio ao nosso trabalho sustentar uma transitividade possível e que, muitas vezes, não se constrói em solidão –mesmo que entre 4 paredes de um consultório. Toda psicologia individual é uma psicologia social, já nos disse Freud!

Nessa linha, pra sintetizar um pouco de como penso nosso ofício, resgato aqui frase de Guattarri, que é citado por Deleuze em “Crítica e Clínica”:

"Os lapsos, os atos falhos, os sintomas são como pássaros que batem com o bico na janela. Não se trata de interpretá-los. Trata-se antes de detectar sua trajetória para ver se podem servir de indicadores de novos universos de referência suscetíveis de adquirirem uma consistência suficiente para revirar uma situação".

Estamos aqui para viver e suscitar reviravoltas. É no que eu acredito e é nessa possibilidade de vida que eu aposto como profissional da Psicologia! Nossa prática sempre será política e não há razão de esconder ou se sentir ressabiado disso. Feliz dia e quero lhes dizer que eu aposto no que podemos fazer, apesar de insatisfeito com baixos salários e desempregos que permeiam nossa prática. Saludos!

Epifanias de quarentena


Hoje resolvi sentar na rua. Fui fazer compras e decidi que precisava sentar um pouco em outro lugar que não fosse a cadeira do meu quarto. Escolhi uns degraus isolados do Shopping Total e sem nenhuma vergonha abaixei minha máscara, pra sentir o vento na minha cara. Sozinho e distante de todos, cada brisa no meu bigode era uma lembrança que me acometia e me vi perdido entre sorrisos e tristezas.

Lembrei de mim mesmo menor, distante. Um pequenino vir-a-ser que por menor que fosse tinha disposições a brigar, mesmo lamentando os efeitos da violência. Gosto dessa foto em especial: faz eu lembrar dos meus tios e dos meus avós. Ao fundo está um jipe que só quem me viu crescer pode dimensionar a importância, pois por muitas horas me viram pedalando. Na minha direita está a Pelica. Uma cadela Collie, que eventualmente sumiu e sempre me perguntei se foi porque parei de ir ver ela “lá fora”.

Lembro dos meus tios felizes, fazíamos limonadas e eventualmente um cordeiro. Lembro das alegrias e tristezas deles, mas sobretudo de como me tratavam como se eu fosse filho deles. Lembro dos avós, porque estavam lá retribuindo os sorrisos e incentivando o movimento de “ser mais” que habita em mim.

Hoje sentei solitário, mas a Pelica está do meu lado, assim como outros cães parceiros que tive. Também estão tios, avós e familiares importantes. A quarentena tem dessas coisas: o distanciamento físico parece absurdo, mas é verdade que nenhuma distância física vence a presença no coração. Com saudades e com força, um abraço.