Dialética do tempo



Dia destes estava andando pela UFSC com minha saudosa caloi, pensando nessa vida. No caminho, cruzei com um casal de idosos. Em outra parte, cruzei com um rapaz aparentemente chateado e depois com uma criança. Comecei a pensar na maravilha e ao mesmo tempo na desgraça que é o tempo. Mas o que é o “tempo”, que “aparece” pra nós tanto nos momentos saudosistas quanto nos momentos de reconhecimento próprio?

O tempo é a matéria. É o que era em confronto com o que é. Não há tempo em um campo abstrato, independente: o tempo só existe quando entramos em um momento de síntese diante de uma contradição de nossas vidas. Naquele momento em que nos imaginamos por um segundo crianças e, de repente, estamos nos vendo em um corpo adulto e lotado de problemas aí o tempo existe enquanto abstração, enquanto resposta a angústia da existência, a contradição do que por um momento penso ou questiono ser com o que de fato sou – é nesta interrupção do fluxo que surge o tempo. Quando a morte de uma pessoa querida se coloca para nós novamente é a matéria que se transforma: o que era já não o é (ou é, mas em outro estado ou condição material) e então logo encontramos a resposta: o tempo passou. Mas o que passou/mudou, mesmo, foi a matéria, a vida. Por isso se coloca a loucura como atemporal: ela é o próprio devir, ela é o movimento puro da vida: a transformação contínua e desordenada. O tempo só cessa de existir quanto nos afundamos no efêmero.
Evidentemente o tempo não é e nem deve ser um problema: a constante guerra travada com a transformação ao longo de nossas vidas nos serve para nossa formação enquanto sujeitos e sustentam a possibilidade de nos situarmos no tempo, no espaço e na história da raça humana. Há sim um problema quando não conseguimos lidar com o tempo e dele fugimos ou contra ele lutamos: seja fazendo plásticas na tentativa de manter um corpo ou quando o apreendemos enquanto tempo estático, imutável e eterno, compreendendo tudo como parte de uma só época ou momento, algo que não compreende a transformação como inevitável mas sim como a linearidade de um processo, na direção de um objetivo fixo máximo (a ilusão de que serei eternamente bom ou jamais superado).
É por isso que o tempo ao mesmo tempo que é a cessão é a transformação: ele é a dialética, a renovação. Consegue ser vida e morte ao mesmo tempo pois constantemente compreende estes dois eventos e constantemente os coloca um contra o outro sempre trazendo um pouco dos dois.

Quando vi a sucessão de pessoas colocada no primeiro parágrafo eu pensei no tempo, e senti um prazer ao mesmo tempo vinculado com angústia, pois sabia que embora não estivesse idoso ao mesmo tempo não sou mais criança – mas que ao mesmo tempo fazer parte desse movimento é belo e me traz a sensação do devir e da busca pela mudança enquanto sujeito do meu tempo e da minha história, faz com que eu saiba quem eu sou.

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